Os partidos políticos são os grandes responsáveis por este estado de coisas. Apresentam programas, vencem as eleições e, uma vez no poder, fazem exactamente o contrário daquilo a que se comprometeram. Violam impunemente o contrato estabelecido com os cidadãos.
A nossa República é mais monárquica do que outra coisa. Antes eram os “afilhados” que tinham o futuro garantido, agora são os filhos que herdam os lugares dos pais. À vista de toda a gente, sem pingo de vergonha. Muitas “famílias” habituaram-se a viver à custa do Orçamento do Estado, numa lógica de aparente democraticidade onde o mérito é substituído pela consaguinidade.
De vez em quando, em vésperas de eleições, lá vêm eles (alguns dos quais “agarrados” ao poder desde 1974 ou pouco mais) apelar ao voto, confiados na falta de memória dos cidadãos e no espírito básico-clubístico de muitos eleitores que votam neste ou naquele tal como são do Benfica ou do Sporting.
Os princípios deram lugar às promessas fantásticas, as ideologias foram substituídas pela necessidade de garantir o emprego à corte subserviente. Muitos, violando-se a si próprios, engolem sapos atrás de sapos em nome da segurança de fazer parte do rebanho.
Perante tal situação (negra, mas que descrevi apenas em tons de cinzento), o que faz o comum dos mortais? Afasta-se. Ainda há dias, um amigo, empresário, confidenciava não votar há mais de 20 anos. E o argumento é inatacável: «Eles são todos iguais!».
Quem sabe se, um dia, a continuar este estado de coisas, não serão apenas os candidatos e respectivas cortes aqueles que irão votar? É possível – já faltou mais.
Pela minha parte, prefiro assumir constantemente uma atitude de desobediência cívica. Não sei se o conceito existe, mas para mim consiste em fazer precisamente o contrário daquilo que pretendem os que governam. Sempre dentro da legalidade, mas de modo a que os efeitos se façam sentir.
O Governo quer aumentar receitas e sobe o imposto sobre a gasolina em 2%? Eu tento consumir menos 2% de gasolina, ou ainda menos. O Governo aumenta brutalmente o imposto sobre imóveis? Adio a troca de casa. Fixa montantes mínimos de colecta para a actividade liberal? Descanso mais e cancelo os “recibos verdes”.
Estes são apenas alguns exemplos, porque a “desobediência” estende-se aos vários sectores da vida. Sempre com a esperança que haja mais cidadãos a pensar de igual modo e que, por esta via, se obrigue os responsáveis a alterar comportamentos. Se vivemos numa economia de mercado, creio ser indipensável assumir uma atitude de consumidor consciente, tanto na acção política como na actividade económica ou nas relações sociais.
Mas esta atitude – pensarão alguns – não tem efeitos práticos. Discordo. Conheço várias situações que dizem precisamente o contrário. Se assumirmos o que pensamos sem rodeios, com rigor, sem medo e com frontalidade, aqueles que decidem – sejam eles ministros (ou ministras), autarcas ou gestores de empresas públicas, simples capatazes ou presidentes de conselhos de administração – acabam por ter de alterar a sua conduta. Ou, então, ficam com os “estádios” às moscas.
Com a Política tal como está, subordinada na generalidade aos medíocres poderes aparelhísticos, sem vergonha e sem princípios, resta ao cidadão resistir. Desobedecer civicamente. Todos os dias. Sempre com a esperança de que “isto” terá de mudar – para melhor, é claro, porque para pior já basta assim.
PS – Poderia ter escrito um texto “ao contrário”, a enaltecer as qualidades de quem nos governa e os benefícios decorrentes da sua acção. Um texto simpático, esquecendo que Portugal é o país onde mais tem aumentado o fosso entre ricos e pobres e que tem dos mais elevados níveis de corrupção. É verdade, poderia ter escrito um texto desses. Mas estaria a mentir.
(texto publicado na edição de hoje do "Campeão das Províncias")
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