sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O discurso de José Sócrates

Fiz o sacrifício de assistir, na íntegra, ao discurso de José Sócrates na abertura do Congresso do Partido Socialista.
Foram 51 minutos que quase me apetece definir numa palavra: vazio. Mas há outra que talvez se aplique melhor: demagogia.

A primeira parte da intervenção, cerca de um quarto de hora, foi o "discurso do nada".
Depois, retive algumas ideias.

José Sócrates falou da baixa do IMI e eu não a senti. Continuo a pagar um valor que julgo exorbitante para viver num modesto apartamento numa das zonas mais humildes de Coimbra. Muitas centenas de euros que me levam a pensar, sempre que sou obrigado a pagá-las, que estou a ser alvo de autêntico roubo.

José Sócrates criticou a comunicação social (falou de «director de jornal» e de «estação de televisão»), mas eu não dispenso as informações da Imprensa e passo bem sem o discurso dos políticos. Aliás, ainda esta semana se ficou a saber que a credibilidade dos políticos políticos anda pelas ruas da amargura - só 1% dos portugueses acredita neles.

José Sócrates falou das Novas Oportunidades e lembrei-me da dona do quiosque onde compro jornais. Quando, depois de ter obtido a certificação do 9.º ano, a tentei motivar para obter o 12.º ano, disse-me com convicção: «Não, não vou tirar. Não se aprende nada...».

José Sócrates falou do aumento dos salários dos Função Pública e eu só tenho visto diminuir, ano após ano, o salário da minha mulher, que é funcionária pública.

José Sócrates falou da aposta na educação e eu sei bem o que isso é, com um filho a estudar na Universidade em Lisboa. As propinas, a renda do quarto, as viagens, as refeições, os livros; cerca de 1.000 euros por mês. E qual é o apoio do Estado? Nada. Zero.

José Sócrates falou da reforma da Administração Pública e eu pensei logo no meu familiar que continua à espera (há quase um ano!!!) que as Finanças enviem o cartão de contribuinte.

Ou seja, em resumo: José Sócrates falou de um país e eu vivo noutro, completamente diferente.

Quanto pude ver, só houve um momento de entusiasmo durante o discurso: quando José Sócrates falou de nova maioria absoluta. Aí levantou-se quase toda a gente, braço no ar, a gritar «PS, PS, PS».
(Nessa altura, tive uma ideia: com a tecnologia hoje disponível, seria possível às televisões colocarem junto a cada rosto a profissão que desempenha, ficando-se assim a saber quais os que vivem das verbas do Estado - do nosso dinheiro colectivo, portanto - e quais os que não vivem. Seria esclarecedor, creio.)

Quanto aos restantes 48 minutos da intervenção de José Sócrates, os (poucos) grandes planos da RTP mostraram rostos desinteressados, tristes, desiludidos, sem ponta de entusiasmo visível.
Se a isso juntarmos o tom do discurso, uma mão-cheia de lugares-comuns, proclamados sem chama e sem emoção, tive a sensação de estar numa cerimónia algo de fúnebre - o "requiem" por esta maioria, quem sabe.
Nem mesmo o rosto de José Sócrates (que me pareceu cansado e sentir algumas dificuldades com o "teleponto") conseguiu desfazer a ideia que, a pouco e pouco, se foi formando no meu espírito.

Vão longe os tempos em que a Política era algo de empolgante em Portugal.


PS 1 - Mal acabado o discurso, ouvi Carlos Magno a tentar interpretar o "peso" do discurso. Como é óbvio, ele tem direito a ter opinião. Tal como eu. E a minha, contrariamente à dele, é simples de enunciar: foi um mau discurso. Se eu fosse professor (sem segundas intenções...), José Sócrates nem sequer iria à oral. Estava chumbado.

PS 2 - Nota curiosa: José Sócrates começou o discurso mais cedo do que o previsto (segundo ouvi na SIC) e terminou-o cinco minutos antes de começar o Benfica-Leixões.

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